Doente do sexo masculino, 38 anos, admitido por dispneia e cansaço para pequenos esforços. Antecedentes pessoais de status toxifilias, endocardite da válvula tricúspide e Hepatite C. O exame objetivo à entrada revelava taquiarrítmia, sopro holossistólico no foco tricúspide e pulsação cervical exuberante. Rx de Tórax com índice cardiotorácico aumentado e ECG com padrão de flutter auricular e bloqueio completo de ramo direito. Analiticamente com NtProBNP de 3800 pg/ml e ecocardiograma transtorácico 3D e transesofágico 2D demonstrando ventrículo direito em diástole 38 mm (dilatado), não compactado com parede livre, aspeto trabeculado na região apical e mesoapical, insuficiência tricúspide grave, TAPSE 12mm. Sem alterações ventrículo esquerdo. Estudo doppler com fluxo na cavidade ventricular ventricular direita nos espaços inter-trabeculares. (fig. 1) Teve alta do serviço cardiologia ao oitavo dia de internamento, clínica e hemodinamicamente estável, em ritmo sinusal e classe II/IV NHYA, referenciado a consulta externa. Em ambulatório realizou ressonância magnética cardíaca (fig. 2) reforçando o diagnóstico de ventrículo direito isolado não compactado, descrevendo fração de ejeção 35%.

O Miocárdio ventricular não compactado (MVNC) é uma entidade rara, usualmente associada com outras malformações estruturais congénitas do coração. O MVNC isolado é definido pela ausência de outras alterações estruturais cardíacas, sendo uma forma de apresentação ainda mais rara, com poucos relatos na literatura.(1) Os critérios diagnósticos de MVNC isolado foram estabelecidos com a técnica de ecocardiografia, salientando-se a estrutura de duas camadas na parede do ventrículo (predominantemente no segmento apical e meso- apical), e a presença de fluxo de sangue na cavidade ventricular em espaços inter trabeculares profundos avaliado por ecocardiograma com estudo Doppler (1,2,3,4). Todos os doentes adultos têm indicação para anticoagulação, independentemente das dimensões e função ventricular(3). Doentes com MVNC tem prognóstico variável, desde períodos completamente assintomáticos até à insuficiência cardíaca grave, culminando em transplante cardíaco e/ou morte.(3,5,6)

Figura I

Ecocardiograma 2D e 3D - Aurícula direita dilatada, Ventrículo direito em diastole dilatado (38 mm), não compactado parede livre com aspecto trabeculado na região apical e mesoapical (12 mm trabéculas para 18 mm espessura total). Válvula tricúspide: dilatação do anel 50 mm; défice de coaptação dos folhetos da válvula (1.5 – 2 cm) Insuficiência tricúspide grave e PSAP = 50 mmHg. TAPSE 12 mm. Veia cava inferior dilatada e sem colapso inspiratório. Pericárdio com derrame ligeiro. Ventrículo esquerdo não dilatado e com boa função. Estudo doppler com fluxo na cavidade ventricular direita nos espaços inter-trabeculares.

Figura II

Ressonância Magnética Cardíaca: trabeculação mesoapical importante com critérios de não compactação, marcada dilatação do Ventrículo direito e diminuição significativa da função sistólica (Fração ej. 35%). Ventrículo esquerdo normal

  BIBLIOGRAFIA  

1) S. Balashankar Gomathi, Nilesh Makadia, and S. Mullasari Ajit. An unusual case of isolated non-compacted right ventricular myocardium. European Journal of Echocardiography (2008) 9, 424–425

2) Richardson P, Mckenna W, Bristow M, et al. Report of the 1995 World Health Organization/International society and Federation of Cardiology Task Force on the definition and classification of cardiomyopathies. Circulation 1996; 93:841–2.

3) Oeschslin E, Attenhofer C, Rohas J, et al. Long term follow-up of 34 adults with isolated left ventricular noncompaction: a distinct cardiomyopathy with poor prognosis. J Am Coll Cardiol 2000; 36:493–500.

4) Agmon Y, Connolly HM, Olson LJ, et al. Noncompaction of the ventricular myocardium. J Am Soc Echocardiogr. 1999; 12:859–863.

5) Ichida F, Hammamichi Y, Miyawaki T, et al. Clinical features of isolated noncompaction of the ventricular myocardium. J Am Coll Cardiol 1999; 34:233–40.

6) Chin TK, Perloff JK, Williams RG, et al. Isolated noncompaction of left ventricular myocardium: a study of eight cases. Circulation 1990; 82:507–13.