Introdução
A fasceíte nodular (FN) é uma entidade pseudosarcomatosa rara, descrita pela primeira vez em 1955 por Konwaller [1]. Apresenta curso clínico benigno podendo aparecer em idade pediátrica mas tipicamente ocorrendo em doentes na quarta e quinta décadas de vida (85% dos doentes com idade inferior a 50 anos) [2;3;4].
Apresenta-se como uma massa de tecidos moles, de rápido crescimento – mais comummente inferior a três meses -, caracterizada por proliferação fibroblástica intensa com expansão à custa da fáscia profunda, com histologia bizarra e elevado índice mitótico sendo essencial a sua destrinça de tumores malignos como o sarcoma [5;6].
Habitualmente, a lesão é única e tem dimensão média de 1,5 a 5cm de diâmetro [3;7]. A localização mais frequente é no antebraço, seguida da coxa e braço mas existem casos de lesões em sítios tão diversos como o pescoço, fossa temporal, parede torácica, mama e cavidade oral [3;7;8;9;10].
A sua etiopatogenia permanece incerta e apesar de existirem relatos de eventos locais traumáticos como predisponentes possíveis tal não é consensual [2;11].
O tratamento consiste em excisão cirúrgica e a recorrência é rara e deve levar à revisão do diagnóstico [4;5].
Caso Clínico
Homem, 81 anos, com carcinoma da próstata sob hormonoterapia, sem outros problemas médicos de relevo. Internado num Serviço de Medicina Interna por pneumonia necrosante direita complicada com derrame pleural loculado parapneumónico que foi abordado por toracocentese. Apresentou resposta favorável às medidas instituídas e completa resolução do quadro.
Quatro meses depois recorre por tumefacção da parede torácica póstero-lateral direita, com aproximadamente 8 semanas de evolução e crescimento rápido nas últimas 2 semanas, com cerca de 5cm de diâmetro, consistência fibroelástica, aderente aos planos profundos, sem sinais inflamatórios associados. Realiza tomografia computorizada de tórax na qual se descreve: massa de partes moles adjacente ao arco médio da costela direita com 5x6cm, heterogénea, com áreas de necrose a sugerir provável etiologia metastática (Figura 1).
Procedeu-se a citologia aspirativa (Figura 2) que sugere etiologia maligna embora não consiga definir a histogénese pelo que o doente efectua core-biópsia guiada por ecografia identificando-se ao exame histológico: áreas de necrose e áreas com células fusiformes/estreladas atípicas num estroma mixóide não se conseguindo afirmar com segurança filiação.
O doente é então submetido a biópsia cirúrgica com exérese total da lesão – cuja análise anatomopatológica revelou um nódulo intramuscular, não capsulado mas de limites relativamente bem definidos, com áreas mixóides e áreas colagenosas e com necrose central. A lesão era de baixa celularidade, com atipia citológica moderada, identificando-se 3 figuras de mitose por dez campos de grande ampliação, nenhuma delas atípica. Assim, assume-se o diagnóstico de fasceíte nodular de subtipo intramuscular (Figuras 3, 4 e 5).
Aos 12 meses de follow-up o doente não apresenta qualquer sinal de recidiva da lesão encontrando-se clinicamente curado.
Discussão e Conclusão
Apesar de tipicamente surgir em doentes de meia idade a fasceíte nodular (FN) pode manifestar-se em qualquer idade. A localização da massa na parede torácica é possível na FN que apresenta predilecção pelas extremidades superiores, seguida dos membros inferiores, tronco, cabeça, pescoço e cavidade oral.Embora não seja consensual que o trauma prévio desempenhe papel na etiopatogenia desta entidade deve ser pesquisada referência a história recente de trauma na zona atingida – como no caso do doente descrito que tinha sido submetido a toracocentese previamente.
No nosso caso, a morfologia descrita pode ser observada em lesões malignas, das quais o principal diagnóstico diferencial a ter em consideração é o mixofibrossarcoma. Na verdade, nas pequenas amostras analisadas previamente - de punção aspirativa e de biópsia por agulha - a atipia citológica observada não permitiu excluir malignidade. Estes aspectos, associados a um comportamento clínico com crescimento rápido e aderência a planos profundos torna essencial que o diagnóstico diferencial seja efectuado com exactidão. Após a exérese cirúrgica, observou-se não se tratar de uma lesão multinodular, não se identificou vascularização característica de mixofibrossarcoma encontrando-se sim um fundo de tecido de granulação, consistente com a história prévia de trauma e ainda um índice mitótico baixo (sem mitoses atípicas) permitindo estabelecer o diagnóstico de fasceíte nodular.
O diagnóstico definitivo de fasceíte nodular pode ser difícil de obter, muitas vezes só sendo possível após exérese completa (e curativa) da lesão, correlacionando uma cuidadosa anamnese com os aspectos histológicos observados.
Figura I

Figura 1: corte coronal de tomografia computorizada do tórax na qual é visível uma massa de partes moles adjacente ao arco médio da costela direita com 5x6cm
Figura II

Figura 2: Fasceíte Nodular (HE 400x – exame citológico); notar a intensa atipia celular, simulando aspectos muito sugestivos de malignidade
Figura III

Figura 3: Fasceíte Nodular (HE 100x – exame histológico); alternância entre áreas mixóides (à direita da figura) e colagenosas (à esquerda), mas ambas de baixa celularidade.
Figura IV

Figura 4: Fasceíte Nodular (HE 400x – exame histológico); a lesão constitui-se fundamentalmente por fibroblastos reactivos, fusiformes a ovalados, com alguns sinais de hemorragia. A atipia, embora reactiva, pode ser focalmente intensa.
Figura V

Figura 5: Fasceíte Nodular (HE 40x – exame histológico); os limites são relativamente bem definidos, observando-se apagamento das fibras musculares na zona de fronteira da lesão.
BIBLIOGRAFIA
Bibliografia
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