A doença aterosclerótica é uma causa frequente de acidentes vasculares cerebrais isquémicos.1 A oclusão completa da artéria carótida representa aproximadamente 5.5% destes casos.2 A apresentação clínica de uma oclusão completa da carótida interna é variada, podendo ser assintomática, ter alterações subtis ao exame neurológico ou provocar a morte.2,3
Doente do sexo masculino é trazido ao serviço de urgência por desequilíbrio e desvio da comissura labial. Na véspera teve perda de visão, não valorizada. Referia antecedentes de hiperuricémia e hábitos tabágicos. Ao exame físico apresentava disartria, desvio do olhar para a direita, hemianópsia homónima esquerda, hipotonia, hemiparésia grau 3 e hemihipostesia dos membros esquerdos, sendo incapaz de realizar marcha, anosognosia e assomatognosia. Na tomografia computarizada crâneo-encefálica apresentava enfarte isquémico agudo no território da artéria cerebral média direita. Realizou ecodoppler dos vasos do pescoço (Fig.1) tendo ausência de fluxo sanguíneo na carótida interna direita, de caraterísticas recentes. Realizou angiografia por tomografia computorizada (Fig. 2) que confirmou oclusão completa da carótida interna direita.
Teve alta clínica ao décimo dia, mantendo hemianopsia, hemiparésia e hemihipostesia esquerdas. Foi orientado para consulta de cirurgia vascular: sem indicação cirúrgica. Passado um ano desenvolveu quadro de epilepsia. Está medicado com ácido acetilsalicílico, rosuvastatina, enalapril, alopurinol, levetiracetam, trazodona e risperidona.
Neste caso clínico, apresentamos um acidente vascular cerebral isquémico de etiologia aterotrombótica, com oclusão total da carótida interna direita, e pretende-se valorizar a presença de sinais precoces, nomeadamente as alterações visuais.2,3 Eventualmente, nesta fase, poderia ainda não estar estabelecida a oclusão completa da carótida. No entanto, deve ter-se em conta outras etiologias de perda súbita de visão, nomeadamente oclusão da artéria e veia centrais da retina, arterite de células gigante, nevrite óptica, compressão nervosa, papiledema ou enxaqueca.4 Nesta situação, a fundoscopia era normal e não existiam alterações analíticas e imagiológicas sugestivas de outras patologias.
Figura I

Ecodoppler da artéria carótida interna esquerda (A) sem alterações velocimétricas do fluxo sanguíneo. Oclusão da artéria carótida interna direita (B) com ausência de fluxo sanguíneo e condicionando maior resistência na artéria carótida comum direita (C).
Figura II

Angiografia por tomografia computorizada dos vasos cervicais demonstrando oclusão completa da artéria carótida interna direita (assinalada com a seta), desde o bulbo até ao sifão carotídeo, e pequena placa de ateroma fibrocalcificada da parede posterior do bulbo carotídeo esquerdo, sem características estenosantes.
BIBLIOGRAFIA
1Gupta A, Chazen JL, Hartman M, Delgado D, Anumula N, Shao H, et al. Cerebrovascular Reserve and Stroke Risk in Patients with Carotid Stenosis or Occlusion: A Systematic Review and Meta-Analysis. Stroke. 2012;43:2884–91.
2Klijn CJM, Kappelle LJ,Tulleken CAF, Gijn JV. Symptomatic Carotid Artery Occlusion: A Reappraisal of Hemodynamic Factors. Stroke. 1997; 28:2084-93.
3Thanvi B, Robinson T. Complete occlusion of extracranial internal carotid artery: clinical features, pathophysiology, diagnosis and management. PostgradMed J. 2007;83:95–9.
4Pula JH, Kwan K, Yuen CA, Kattah JC. Update on the evaluation of transient vision loss. Clinical Ophthalmology. 2016;10:297-303.