A doença cerebrovascular é causada por vários processos fisiopatológicos que envolvem os vasos sanguíneos cerebrais. A perda súbita da função cerebral focal é a principal característica do acidente vascular cerebral.1
Homem, 89 anos, sem história médica passada. Recorreu ao serviço de urgência, por afundamento do estado de consciência, associado a disartria, hemiparesia, paresia facial central e hemianopsia homónima direitas - 12 pontos na escala de NIHSS - com 3 dias de evolução. TC-cerebral sem imagem de evento isquémico ou hemorrágico agudo, pelo que foi admitido na enfermaria de Medicina Interna. Repetiu TC-CE 48h após a admissão, que foi sobreponível (Figura 1). Eletroencefalograma normal. Perfil lipídico e hemoglobina glicada sem alterações. Descoberta estenose da artéria carótida esquerda de 90%, sendo submetido a endarterectomia carotídea, no oitavo dia de hospitalização. Após a cirurgia apresentou melhoria dos défices neurológicos – NIHSS 7. Manteve terapêutica antitrombótica com ácido acetilsalicílico 100mg/dia. Pressão arterial sistólica entre 140 e 150mmHg. Sete dias após a cirurgia apresentou quadro de cefaleia, confusão e agravamento da disartria e hemiparesia direita. Realizada TC-CE que demonstrou hemorragia intraparenquimatosa frontal-parietal-temporal esquerda de grande volume, com desvio lateral das estruturas da linha média até 2,5cm (Figura 2). Dada a idade e comorbilidades do doente, nenhuma intervenção foi feita, acabando por falecer.
A síndrome de hiperperfusão cerebral (SHC) é uma complicação primária rara da endarterectomia carotídea (0 a 3%). 2, 3 A hemorragia intracerebral (HIC) após intervenção carotídea está associada à SHC. Dada a relação temporal com a intervenção, tudo leva a crer que no caso apresentado a HIC se deva a uma SHC. Vários mecanismos parecem contribuir, como o compromisso da autorregulação dos vasos sanguíneos cerebrais e alterações do fluxo após a revascularização.4 A hipertensão arterial é um predecessor frequente desta síndrome, no entanto não há consenso quanto aos valores de pressão arterial associados. 3
Figura I

TC-CE à admissão e às 48h após a admissão
Figura II

Volumosa hemorragia intraparenquimatosa frontal-parietal-temporal esquerda
BIBLIOGRAFIA
1. Sacco RL, Kasner SE, Broderick JP, Caplan LR, Connors JJ, Culebras A, et al. An updated definition of stroke for the 21st century: a statement for healthcare professionals from the American Heart Association/American Stroke Association. Stroke. 2013 Jul;44(7):2064-89. PubMed PMID: 23652265.
2. Galyfos G, Sianou A, Filis K. Cerebral hyperperfusion syndrome and intracranial hemorrhage after carotid endarterectomy or carotid stenting: A meta-analysis. Journal of the neurological sciences. 2017 Oct 15;381:74-82. PubMed PMID: 28991720.
3. Siroos B, Harirchian MH, Kazemi Khaledi A, Ghaffarpour M, Golshani S. Cerebral Hyperperfusion Syndrome, an Unusual but Disastrous Complication of Carotid Recanalization: A Case Report. Journal of stroke and cerebrovascular diseases : the official journal of National Stroke Association. 2017 Oct 05. PubMed PMID: 28988884.
4. Abreu P, Nogueira J, Rodrigues FB, Nascimento A, Carvalho M, Marreiros A, et al. Intracerebral hemorrhage as a manifestation of cerebral hyperperfusion syndrome after carotid revascularization: systematic review and meta-analysis. Acta neurochirurgica. 2017 Sep 15. PubMed PMID: 28916863.