Os autores apresentam o caso de um homem de 73 anos, agricultor, sem antecedentes relevantes, que recorreu ao serviço de urgência por dor no hipocôndrio direito, doloroso à palpação profunda, vómitos e febre (39º) com 3 dias de evolução. Analiticamente verificou-se neutrofilia, proteína C reativa de 7,95 mg/dl, elevação das transaminases, fosfatase alcalina, gama-GT e hiperbilirrubinémia conjugada. No radiograma abdominal observava-se lesão nodular hepática, confirmada por ecografia: “formação nodular (80x70mm), heterogénea, predominantemente sólida, com áreas quísticas”, (Fig. 1). Realizou tomografia computorizada (TC) abdominal que mostrou “volumosa lesão expansiva (95x85mm) no lobo direito, hipodensa e heterogénea, calcificada à periferia”, (Fig. 2). A pesquisa de anticorpos séricos anti-Echinococcus (AcEC) foi positiva, chegando-se ao diagnóstico de quisto hidático (QH) tipo V da classificação da Organização Mundial de Saúde. Foi avaliado por Cirurgia que face às dimensões do quisto e efeito de massa associado, optou por realização de periquistectomia hepática, cuja histologia corroborou o diagnóstico. Iniciou albendazol (400mg 12/12h) uma semana antes do procedimento, que manteve durante quatro semanas no pós-operatório. Nesse período desenvolveu abcesso hepático, abordado com antibioterapia de largo espectro e drenagem percutânea guiada por TC, com evolução favorável. Manteve seguimento em consulta de Medicina e Cirurgia, sem evidência de recorrência em ecografias abdominais de controlo e com AcEc negativos após dois anos. A hidatidose é causada por estados larvares de Echinococcus granulosus1, sendo uma doença endémica em Portugal2,3. O diagnóstico assenta na clínica, imagiologia e serologia1, podendo causar sintomas apenas quando existe rutura ou compressão2, como se verificou neste doente. Apesar de ser recomendada a estratégia watch and wait para os QH tipo V, o tratamento deve ser individualizado e perante efeito de massa deve ser ponderada cirurgia2. Quanto mais radical esta for, mais prováveis serão os efeitos secundários1,2. É fundamental incluir a hidatidose no diagnóstico diferencial de lesões hepáticas focais4.
Figura I

Imagem ecográfica de quisto hidático localizado no lobo direito hepático (80x70mm).
Figura II

Corte axial de tomografia computorizada abdominal a revelar quisto hidático no lobo direito hepático (95x85mm), com calcificação periférica.
BIBLIOGRAFIA
1.McManus DP, Gray DJ, Zhang W, Griffith YY. Diagnosis, treatment, and management of echinococcosis. BMJ. 2012;344(3866):1-13.
2.Brunettia E, Kernb P, Vuitton DA. Expert consensus for the diagnosis and treatment of cystic and alveolar echinococcosis in humans. Acta Tropica. 2010;114:1-16.
3.Morais JADd. Progressão e declínio da hidatidose humana em Portugal: análise histórico-epidemiológica. Revista da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna. 2010;17(4):274-285.
4.Rinaldi F, Brunetti E, Neumayr A, Maestri M, Goblirsch S, Tamarozzi F. Cystic echinococcosis of the liver: A primer for hepatologists. World J Hepatol. 2014;6(5):293-305.