Homem de 73 anos com história de trombose venosa profunda no membro inferior direito há um ano. Do estudo então efectuado apenas se observou adenomegálias cervicais (as maiores com 2,5 cm) e linfocitose, não tendo realizado biópsia.
Foi internado por epigastralgia com irradiação lombar esquerda e anorexia com 4 dias de evolução, associado a perda ponderal não quantificada e sudorese nocturna, sem febre ou foco infecioso identificado.
Objectivamente destacava-se palpação abdominal dolorosa, com esplenomegália 10 cm abaixo do rebordo costal esquerdo; sem adenopatias.
Analiticamente, a salientar, hemoglobina 9,9 g/dL (normocítica e normocrómica); leucócitos 36,700 x 109/L; linfócitos 75,6%; velocidade de sedimentação 115 mm/h; PCR 18,1 mg/dL; ureia 119 mg/dL; creatinina 4,32 mg/dL, com creatinina basal de 1,7 mg/dL.
Apresentava hemoglobinúria+++, proteinúria 57,3 mg/dL e relação albumina-creatinina 91,44 mg/gr.
A ecografia abdominal documentou esplenomegália homogénea, com 19 cm de maior eixo e a ecografia renal apresentava redução da habitual diferenciação parenquimossinusal, por aumento difuso da ecogenicidade do parênquima, sugestivo de nefropatia.
Após exclusão das causas pré e pós-renais de lesão renal aguda, realizou-se biópsia renal, cuja histologia foi compatível com linfoma do manto.
O doente foi transferido para o Serviço de Hematologia do IPO de Lisboa.
O linfoma do manto é uma neoplasia das células periféricas tipo B, correspondendo a cerca de 6% dos Linfomas Não Hodgkin1,2,3. A idade média de apresentação é de 63 anos, sendo mais frequente no sexo masculino3.
70% dos casos apresenta-se geralmente em estádio IV, com adenopatias e sintomas sistémicos3. O aumento da expressão BCL1 é resultado da alteração cromossómica mais característica t(11;14)1,3. Os linfócitos B monoclonais CD5+ fazem diagnóstico diferencial com outros linfomas de pequenas células1,3
O diagnóstico é geralmente feito por biópsia ganglionar1,3, sendo a infiltração renal extremamente rara2. A investigação do agravamento da função renal foi fundamental para um diagnóstico correcto.
Figura I

Na imagem 1, corada a hematoxilina-eosina, observam-se dois glomérulos, um deles com cápsula de Bowman ligeiramente espessada, reduplicada e colapso ligeiro do novelo. Túbulos com alterações epiteliais degenerativas ligeiras, arteríola sem alterações, atrofia tubular e fibrose intersticial. Há um infiltrado de células pequenas, redondas e azuis, de etiologia branda e com um índice mitótico baixo, que infiltra o parênquima, poupando as estruturas. Posteriormente efectuou-se estudo imuno-histoquímico da população celular, verificando-se que esta expressava de forma intensa e difusa CD20, CD5 e BCL1 (ciclina D1) (imagens 2,3 e 4, respectivamente), concluindo-se tratar de Linfoma do Manto. Admitiu-se glomérulo com lesões isquémicas por efeito compressivo da neoplasia e glomerulonefrite associada ao linfoma.
BIBLIOGRAFIA
Referências:
1. Dreyling M, Campo E, Hermine O, Jerkeman M, Le Gouill S, Rule S, et al. Newly diagnosed and relapsed mantle cell lymphoma: ESMO Clinical Practice Guidelines for dianosis, treatment and follow-up. Annals of Oncology 28 (Supplement 4): iv62-iv71, 2017.
2. Lee H, Seo J, Cho H, Kang Y, Bae E, Lee D et al. Renal involvement of mantle cell lymphoma leading to end stage renal disease. Hemodialysis International 2012; 16: 104-108
3. Longo D. Malignancies of Lymphoid Cells. In: Kasper D, Fauci A, Hauser S, Longo D, Jameson L, Loscalzo J. Harrison´s Principles of Internal Medicine 19th. McGraw Hill; 2015. P.695-710.