A tuberculose mantém-se uma doença endémica em Portugal, de carácter insidioso e de morbilidade potencial significativa.
Apresenta-se o caso de um homem de 22 anos, natural de Cabo Verde, residente em Portugal há 14 anos. São desconhecidas patologias associadas, com serologia negativa para vírus da imunodeficiência humana (VIH). Na sequência de lombalgia esquerda de características mecânicas, com 5 meses de evolução, realizou tomografia computorizada (TC) abdominopélvica que revelou abcesso do músculo psoas-ilíaco esquerdo com 27 cm de maior eixo, estendendo-se desde o nível do corpo de L1 até à pequena tuberosidade do fémur (Fig. 1). Identificou-se ainda processo de espondilite centrada a L3 e L4, abcesso epidural e envolvimento de músculos paraespinhais. Foi realizada drenagem percutânea do abcesso do psoas-íliaco guiada por TC, tendo exame cultural revelado Mycobacterium tuberculosis.
O atingimento osteoarticular da tuberculose (TOA) ocorre em 2,2 a 4,7% dos casos na Europa e EUA, afectando principalmente doentes com mais 55 anos nos nativos de países desenvolvidos, e doentes entre os 20-35 anos na população imigrante nestes países1. A espondilite tuberculosa (Mal de Pott) é a forma mais comum de TOA, compreendendo cerca de metade dos casos2. A sua incidência tem aumentado na última década nos países desenvolvidos devido à imigração e à epidemia do VIH. Contudo, a semiologia é independente da sua co-apresentação com este agente. Os sintomas são habitualmente insidiosos, evoluindo em média por 2-7 meses até o diagnóstico. A dorsolombalgia está habitualmente presente (83-100%), sendo que um terço apresenta febre ou sintomas constitucionais – particularmente se houver associação a tuberculose extra-vertebral ou doença disseminada. O envolvimento para-vertebral é muito frequente, com massas epidurais presentes em 70%. Os abcessos do psoas são relativamente frequentes, embora a verdadeira incidência seja desconhecida1. A origem destes abcessos pode decorrer da disseminação direta de estruturas adjacentes, representando as estruturas ósseas a principal fonte de disseminação contígua (66,7% num estudo de 124 doentes, Lopéz et al, 20093). O diagnóstico é estabelecido por microscopia e exame cultural do material infectado4.
O caso clínico evidencia a concomitância de apresentação de abcesso epidural e de abcesso do músculo psoas-ilíaco em um doente com diagnóstico de tuberculose esquelética vertebral.
Figura I

Corte coronal de TC abdominopélvica. As setas identificam a formação abcedada com 10 x 9.8 x 27cm, que se estende ao longo do músculo psoas ilíaco esquerdo.
BIBLIOGRAFIA
1 – Pigrau-Serrallach C, Rodríguez-Pardo D. Bone and joint tuberculosis. Eur Spine J (2013) 22 (Suppl 4): S556-S566.
2 – Vohra R, Kang HS, Dogra S, et al. Tuberculosis osteomyelitis. J Bone Joint Surg Br 1997; 79:562.
3 – Navarro López V, Ramos JM, Meseguer V, et al. Microbiology and outcome of iliopsoas asbcess in 124 patients. Medicine (Baltimore) 2009; 88:120.
4 – Colmenero JD, Jiménez-Mejías ME, et al. Tuberculous vertebral osteomyelitis in the new millenium: still a diagnostic and therapeutic challenge. Eur J Clin Microbiol Infect Dis (2004) 23: 477-483.