Apresentamos o caso de uma doente de 73 anos, proveniente de Cabo Verde, com 2 semanas de febre, dor no hipocôndrio direito, náuseas, anorexia e hepatomegália palpável.
Analiticamente constatava-se hemoglobina 5.4g/dL, Leucocitose 20.500x10^9/L, eosinofilia 10.600x10^9/L (51.8%), PCR 8.80 mg/dL e elevação das enzimas hepáticas.
Fez ecografia e tomografia computorizada (TC) abdominais sugestivas de hematoma subcapsular hepático, com áreas de edema/hemorragia (Fig. 1 e 2).
A pesquisa de ovos e parasitas nas fezes foi negativa, fazendo-se o diagnóstico de Fascíola hepática por serologia (titulo 1/640). Fez toma única de triclabendazol verificando-se melhoria analítica e clínica, aguardando reavaliação imagiológica em ambulatório.
A infeção por Fascíola hepática é mais comum nos países subdesenvolvidos, estimando-se uma prevalência de 3% em Portugal (1). É uma zoonose que infecta principalmente bovinos e ovinos, sendo transmitida ao homem pela ingestão de vegetais crus ou água contaminada (2).
A migração do parasita até ao fígado desencadeia a fase aguda, caracterizada por inflamação associada a dor abdominal, febre, náuseas e anorexia (2,3). Posteriormente ocorre migração das larvas para os ductos biliares, com complicações obstrutivas que caracterizam a fase crónica (1,2).
O diagnóstico, dificultado pela apresentação inespecífica e ausência de parasitas nas fezes na fase aguda, é feito por serologia. Frequentemente há elevação das transaminases e eosinofilia (1,2,4). Do diagnóstico diferencial fazem parte a colangite, colecistite, carcinoma hepatocelular, colangiocarcinoma e outras infeções (amebíase e hidatidose) (5).
Os achados em TC consistem em pequenas lesões hipodensas nodulares, subcapsulares e coalescentes. A hemorragia e hematoma subcapsulares são complicações graves e raras, sugestivas deste diagnóstico quando associadas a eosinofilia (1,3).
O tratamento indicado é com tricabendazol 10mg/Kg em dose única, ou dupla caso haja carga parasitária relevante ou falência terapêutica (2,4).
As extensas e exuberantes lesões ilustradas neste caso, associadas a hematoma subcapsular, constituem uma apresentação rara da infeção aguda por Fascíola hepática.
Figura I

Tomografia computorizada abdominal mostra coleção subcapsular (hematoma) associada a heterogeneidade difusa do parênquima hepático, com extensas áreas hipocaptantes de distribuição periportal desde a periferia até ao hilo, correspondendo a áreas de edema/hemorragia intra-hepática.
Figura II

Tomografia computorizada abdominal mostra coleção subcapsular (hematoma) associada a heterogeneidade difusa do parênquima hepático, com extensas áreas hipocaptantes de distribuição periportal desde a periferia até ao hilo, correspondendo a áreas de edema/hemorragia intra-hepática.
BIBLIOGRAFIA
1. Dusak A, Onur MR, Cicek M, Firat U, Ren T, Dogra VS. Radiological Imaging Features of Fasciola hepatica Infection - A Pictorial Review. J Clin Imaging Sci. 2012;2:2.
2. Harrington D, Lamberton PHL, McGregor A. Human liver flukes. Lancet Gastroenterol Hepatol. 2017;2(9):680-9.
3. Bächler P, Baladron MJ, Menias C, Beddings I, Loch R, Zalaquett E, et al. Multimodality Imaging of Liver Infections: Differential Diagnosis and Potential Pitfalls. Radiographics. 2016;36(4):1001-23.
4. Marcos LA, Terashima A, Gotuzzo E. Update on hepatobiliary flukes: fascioliasis, opisthorchiasis and clonorchiasis. Curr Opin Infect Dis. 2008;21(5):523-30.
5.Kaya M, Beştaş R, Cetin S. Clinical presentation and management of Fasciola hepatica infection: single-center experience. World J Gastroenterol. 2011;17(44):4899-904.