Mulher de 44 anos, seguida em consulta de Psiquiatria por distúrbio afetivo bipolar desde 2013. Trazida ao Serviço de Urgência por desorganização do pensamento e da linguagem com uma semana de evolução. Ao exame objetivo destaca-se afasia de condução. A TC-CE revelou múltiplas lesões hipodensas, motivo pelo qual realizou RM-CE: “(...) existência de múltiplas lesões quísticas, intra-axiais, do hemisfério cerebral direito (Fig. 1 e 2), com topografia frontoparietal e distribuídas predominantemente na transição corticomedular e algumas na substância branca profunda nomeadamente um quisto relativamente volumoso adjacente ao corno frontal direito. (...) sugerindo a hipótese de múltiplos quistos parasitários (neurocisticercose em fase ativa com quistos viáveis).” Sem sinais oculares de cisticercose. Epidemiologicamente apresentava contato domiciliar com infeção a Taenia solium. Perante estes achados a doente iniciou albendazol que cumpriu 15 dias com melhoria clínica. Excluídos AVC, doenças autoimunes e outras infeções. Pesquisa de Ac. IgG Taenia solium negativo.
A neurocisticercose (NCC) é a parasitose mais comum do sistema nervoso central1, particularmente em áreas endémicas como a Ásia e África.2 Em Portugal, maioritariamente é devido às crescentes taxas de imigração de antigas colónias africanas3 e em locais com deficiente saneamento básico.3
Trata-se de infeção parasitária causada pela larva da Taenia solium, o Cysticercus cellulosae.4
As convulsões (80%) são a manifestação mais comum da NCC.5 Os défices neurológicos focais (16%), hipertensão intracraniana (12%)5 e sintomas neuropsiquiátricos1 constituem outras manifestações.
Na fase ativa, a abordagem terapêutica assenta na combinação de tratamento sintomático, antiparasitário e/ou cirúrgico.2
Segundo Del Brutto et al6, a presença de lesões quísticas francamente sugestivas de NCC descritas na RM, história epidemiológica e os dados clínicos constituem critérios para estabelecer um diagnóstico provável.
Este caso é importante na medida em que demonstra a necessidade de manter um amplo diagnóstico diferencial no adulto jovem com défice neurológico de novo.
Figura I

1. Cortes sagitais de imagens de ressonância magnética, ponderada em T1 (A) e em T2 FLAIR (B), demonstrando múltiplas lesões quísticas do hemisfério cerebral direito com topografia frontoparietal
Figura II

2. Cortes axiais (A e B) e corte coronal (C) de imagens de ressonância magnética, ponderadas em DP T2 (A e B) e T2 (C) que demonstram lesões quísticas do hemisférico cerebral direito e algumas na substância branca profunda nomeadamente 1 quisto relativamente volumoso adjacente ao corno frontal direito (seta branca)
BIBLIOGRAFIA
1. Verma A, Kumar A. Neurocysticercosis presenting as acute psychosis: A rare case report from rural India. Asian J Psychiatr. 2013;6(6):611-613. doi:10.1016/j.ajp.2013.06.008
2. Garcia HH, Nash TE, Del Brutto OH. Clinical symptoms, diagnosis, and treatment of neurocysticercosis. Lancet Neurol. 2014;13(12):1202-1215. doi:10.1016/S1474-4422(14)70094-8
3. Valadas E, Badura R, Marques T, et al. A case of imported neurocysticercosis in Portugal. J Infect Dev Ctries. 2015;9(1):114-117. doi:10.3855/jidc.5032
4. Morgado C, Gomes LB, de Campos JG. [Neurocysticercosis. An imaging analysis of 35 cases]. Acta Med Port. 1994;7(5):269-275. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/8073900.
5. Carabin H, Ndimubanzi PC, Budke CM, et al. Clinical manifestations associated with neurocysticercosis: A systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2011;5(5). doi:10.1371/journal.pntd.0001152
6. Del Brutto OH, Rajshekhar V, White AC, et al. Proposed diagnostic criteria for neurocysticercosis. Neurology. 2001;57(2):177-183. doi:10.1212/WNL.57.2.177