Introdução
O mesotelioma maligno (MM) é uma neoplasia agressiva, e pouco frequente1. Tem origem nas células mesoteliais da pleura, sendo os principais órgãos afectados os pulmões e as estruturas mediastínicas2. Apresenta uma evolução insidiosa com um período de latência de quinze ou mais anos após exposição3. A exposição a asbestos é a sua principal causa e em raros casos a radiação pode causar a doença4.
O MM tem mau prognóstico e é refractário à maioria das terapêuticas convencionais 4, sendo de 12 meses a média de sobrevivência em doentes com doença avançada4,1.
Caso Clínico
Mulher de 71 anos, caucasiana, recorreu ao serviço de urgência por quadro de dispneia progressiva a médios esforços e tosse seca com 1 mês de evolução.
Antecedentes pessoais de linfoma Hodgkin escleronodular submetido a radioterapia, doença renal crónica estadio IIIa e hipertensão arterial essencial medicada.
No exame objetivo da urgência apresentava-se eupneica, à auscultação tons cardíacos normofónicos, rítmicos e sem sopros, murmúrio vesicular abolido nos dois terços do hemitórax esquerdo.
Laboratorialmente destacava-se anemia normocítica normocrómica (Hb 11.6g/dL, VGM 95.9fL) sem aumento dos parâmetros inflamatórios.
Na telerradiografia (Figura 1.) e tomografia computorizada de tórax (Figura 2.) com volumoso derrame pleural esquerdo, espessamento irregular e nódulos sólidos na pleura mediastínica e costal.
Realizou toracoscopia com aspiração de 1750 ml de líquido amarelo citrino,
compatível com exsudado, negativo ao exame direto e micobacteriológico, com adenosina deaminase (ADA), amílase dentro da normalidade e anticorpos antinucleares negativos. Líquido pleural sem evidência de células neoplásicas. Foi realizada biopsia pleural compatível com mesotelioma epitelióide (Figura 5 e 6) e talcagem via toracoscopia.
Para o estadiamento da neoplasia realizou tomografia por emissão de positrões (Figura 3.) que evidenciou um padrão nodular localizado no mediastino.
Pelo diagnóstico de mesotelioma maligno realizou 6 ciclos de quimioterapia, com cisplatino e permetrexed, com boa resposta imagiológica (Figura 4.) e laboratorial, pelo que foi proposta para pleurectomía. Realizou decorticação cirúrgica do hemitórax esquerdo e pleurectomia com remoção do diafragma e colocação de prótese.
No pós-operatório, foi admitida na unidade de cuidados intensivos. Como intercorrência durante o internamento desenvolveu choque séptico com ponto partida respiratório, tendo sido isolado S. maltophilia em lavado broncoalveolar (com TSA), observando-se uma boa resposta face às medidas instituídas, nomeadamente, fluidoterapia, suporte vasopressor e antibioterapia, inicialmente empírica e posteriormente dirigida ao agente isolado.
A doente apresentou uma evolução clínica favorável, sem limitação funcional e sem recorrência de doença neoplásica até à data.
Discussão
O MM pleural é o tipo mais frequente de MM. Doentes em que a causa de MM foi a radiação ionizante, à semelhança do caso descrito, caracterizam-se por ser mais novos e terem uma sobrevivência significativamente mais longa, quando comparados com doentes expostos a asbestos3.
Histologicamente o MM pode apresentar-se como epitelióide (o mais comum e descrito no caso clínico), sarcomatóide ou misto5. O diagnóstico do MM pleural é estabelecido por biopsia1. Neste caso, o diagnóstico definitivo foi possível graças à pronta resposta da equipa da Pneumologia de intervenção, o que agilizou a procura do diagnóstico e o início do tratamento, tendo um determinante papel no prognóstico do caso.
A quimioterapia com permetrexed e um composto de platina como a cisplatina ou carboplatina é a abordagem habitual para o MM pleural. Como parte de uma abordagem combinada, aproximadamente 20% dos doentes podem ser candidatos a cirurgia de resseção completa, como relatado neste caso1.
O benefício cirúrgico parece estar limitado a doentes com o subtipo epitelióide. Em doentes com as variantes sarcomotóide ou mista, submetidos a cirurgia, as taxas desobrevivênciaparecem ser iguais ou menores que nos doentes sob terapêutica não cirúrgica6.
Dada a evolução dinâmica deste tipo de patologia não foi surpreendente a evolução favorável da doente, uma vez que a boa resposta face à quimioterapia alterou o estadiamento da doença, permitindo a realização de uma cirurgia com impacto positivo no prognóstico. O subtipo histológico de MM encontrado contribuiu também para a boa evolução face ao tratamento cirúrgico instituído.
Conclusão
O MM é uma patologia com baixa prevalência e a sua etiologia associada a radiação ionizante é pouco frequente. O subtipo histológico e a resposta à quimioterapia tiveram ambos um impacto positivo no prognóstico.
Figura I

Telerradiografia de tórax com extenso derrame pleural no hemitórax esquerdo.
Figura II

Tomografia computorizada toraco-abdomino-pélvica com derrame pleural esquerdo, nódulos sólidos e irregulares em pleura mediastínica e costal.
Figura III

Tomografia por emissão de positrões que evidencia padrão nodular localizado no mediastino.
Figura IV

Tomografia computorizada pós – quimioterapia, sem evidência de nódulos sólidos ou derrame pleural
Figura V

Pleura com proliferação infiltrativa de células mesoteliais com moderado pleomorfismo (inset), com marcada desmoplasia do estroma
Figura VI

Estudo imunohistoquímico que confirma origem mesotelial das células neoplásicas: calretinina e podoplanina (inset)
BIBLIOGRAFIA
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2. Gill R, Richards W, Yeap B, Matsuoka S. (2012). Epithelial malignant pleural mesothelioma after extrapleural pneumonectomy: stratification of survival with CT-derived tumor volume. Am J Roentgenol 198(2): 359-363.
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5. Travis D, Brambilla E, Muller-Hermelink K, Harris C (Eds.) (2004): World Health Organization Classification of Tumours. Pathology and Genetics of Tumours of the Lung, Pleura, Thymus and Heart. IARC Press: Lyon
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