As crioglobulinas são imunoglobulinas (Ig) que precipitam a baixas temperaturas e são passíveis de detecção quando incubadas a 37º.1Podem ser classificadas em três tipos, consoante o tipo de imunoglobulinas que as compõem: as crioglobulinas de tipo 1 são compostas por um anticorpo monoclonal, as tipo 2 por IgG policlonais e IgM monoclonais e as tipo 3 por IgG e IgM policlonais.2A crioglobulinemia desencadeia fenómenos de vasculite de pequenos e médios vasos causados por depósito de complexos imunes contendo crioglobulinas.3,4As manifestações clínicas mais frequentes incluem fadiga, artralgias, púrpura ortostática, neuropatia e glomerulonefrite.1,5
Mulher de 72 anos internada por quadro constitucional com cinco meses de evolução associado a astenia e artralgias. Constatada anemia, elevação dos parâmetros de citocolestase, velocidade de sedimentação elevada e factor reumatóide positivo. Ao exame físico objectivado desenvolvimento de lesões purpúricas dos membros inferiores quando em ortostatismo. No décimo dia de internamento apresentou alterações da força e sensibilidade do pé esquerdo que revelaram tratar-se de mononeurite múltipla. Posteriormente desenvolveu lesão renal aguda rapidamente progressiva, com sedimento urinário activo e proteinúria.
A pesquisa de crioglobulinas revelou a presença de imunoglobulinas de tipo IgG e IgM, policlonais, compatíveis com crioglobulinemia tipo III. Serologia VHC (vírus da hepatite C) negativa, assim como os ANA (anticorpos antinucleares) e anti-ENA (antigénios nucleares extraíveis). Realizada biópsia renal, que mostrou vasculite de pequenos e médios vasos e glomerulonefrite crescêntica. Iniciou terapêutica com corticoterapia e ciclofosfamida com evolução favorável.
O caso apresentado representa o atingimento sistémico por uma doença autoimune pouco frequente – a crioglobulinemia tipo III, com atingimento renal, neurológico, hepático e dermatológico.
Figura I

Púrpura Ortostática
Figura II

Biópsia renal - vasos arteriais (X) rodeados de infiltrado inflamatório de predomínio linfocitário (*)
BIBLIOGRAFIA
1. Takada S, Shimizu T, Hadano Y, Matsumoto K. Cryoglobulinemia ( Review ). 2012;3–8.
2. Saint-louis H. Biologic and Clinical Significance of Cryoglobulins A Report of 86 Cases. 1974;57(November).
3. Charles J. Nomenclature of systemic vasculitides: Proposal of an international consensus conference. 1995;(March):1995.
4. Trendelenburg M and Schifferli JA. Cryoglobulins are not essential. Ann Rheum Dis. 1998;57:3–5.
5. Ferri C. Mixed cryoglobulinemia. 2008;17:1–17.