A neuroartropatia de Charcot do pé e tornozelo é uma doença crónica não infeciosa, progressiva e incapacitante, com destruição óssea e articular e elevado risco de amputação.1
Nos países desenvolvidos, a causa mais frequente é a neuropatia diabética, sendo o pé e tornozelo os locais mais afectados e tendo uma incidência de 1,4% na população diabética.2
Apresenta-se um homem de 46 anos, pedreiro, com antecedentes dediabetes mellitustipo 2 com dez anos de evolução, insulino-tratado com deficiente controlo metabólico e má adesão à terapêutica (hemoglobina glicada 14-17%). Tinha complicações microvasculares nomeadamente retinopatia, nefropatia e neuropatia. Após sete anos do diagnóstico da diabetes (2013) teve um primeiro episódio de artropatia de Charcot no membro inferior esquerdo (fig 1), no contexto de traumatismo ligeiro, a condicionar edema e dor locais e dificuldade na marcha.
Manteve actividade profissional por períodos, a adesão irregular às consultas e o incumprimento terapêutico.
Passados três anos após aquele episódio é internado por agravamento do quadro álgico, edemas dos membros inferiores e marcada impotência funcional com marcha impossível, negando febre ou trauma.
Realizou radiografia que evidenciou marcado envolvimento bilateral dos ossos do tarso, com componente de destruição óssea, luxação articular e expressão astragalina dominante (fig 2). Foi avaliado por Fisiatria e Ortopedia ficando com indicação para imobilização e posteriormente ortóteses e treino de marcha. Assistiu-se a lenta melhoria clínica com transferência posterior para unidade de reabilitação.
A imobilização é o pilar do tratamento, em média cerca de 6 semanas com progressão para calçado terapêutico às 12 semanas.3,4
O diagnóstico precoce é difícil, devendo ser considerado num diabético mal controlado e com neuropatia periférica que surge com sinais inflamatórios num pé, sem ulceração cutânea. Estabelecidas as lesões, a abordagem terapêutica é complexa pela recorrência de luxações, fracturas e desenvolvimento de úlceras, podendo evoluir até à amputação.
Figura I

Achatamento da superfície lateral do astrágalo (2013)
Figura II

Envolvimento bilateral dos ossos do tarso (ponteado), com componentes de destruição e luxação (2016)
BIBLIOGRAFIA
1- Baptista, Carolina; Mariano, João Cura; Artropatia de Charcot pé e tornozelo, Rev Port Ortop Traum, 2012, 20(2): 255-262.
2- Smith DG, Barnes BC, Sands AK, Boyko EJ, Ahroni JH: Prevalence of radiographic foot abnormalities in patients with diabetes. Foot Ankle Int 1997; 18: 342-346.
3- Schon LC, Easley ME, Weinfeld SB: Charcot neuroarthropathy of the foot and ankle. Clin Orthop Relat Res 1998; 349: 116- 131.
4- Van der Ven, Chapman CB, Bowker JH: Charcot neuroarthropathy of the foot and ankle. J Am Acad Orthop Surg 2009; 17: 562-571.