O pseudomixoma peritoneal (PMP) é uma patologia muito rara (incidência de 1:1.000.000), de curso indolente e que ocorre mais frequentemente em mulheres, com idade média ao diagnóstico de 58 anos.1 Caracteriza-se pela acumulação na cavidade peritoneal de uma substância mucinosa com origem em células epiteliais de um tumor primário (nomeadamente apêndice ou ovário) ou numa reacção epitelial do peritoneu parietal. A apresentação clínica é inespecífica e grande parte dos diagnósticos é estabelecida de forma incidental, frequentemente no decurso de uma laparotomia exploradora.1
Homem de 53 anos, raça negra, autónomo e com antecedentes de etilismo, admitido no serviço de urgência por quadro de perda ponderal, distensão abdominal e enfartamento pós-prandial com 15 meses de evolução e agravamento progressivo. Apresentava abdómen globoso e tenso à palpação, com macicez nos flancos e sem outros sinais particulares. A ecografia abdominal demonstrou “moderada ascite e espessamento difuso do grande epíplon”, confirmado por TC abdominal que mostrou ainda “lobulação dos contornos hepático e esplénicos” (Fig. 1). Laboratorialmente com elevação dos parâmetros inflamatórios. A análise citopatológica do líquido ascítico gelatinoso e espesso permitiu a identificação de abundante substância mixóide com coloração PAS (ácido periódico de schiff) e de muco, tendo-se estabelecido o diagnóstico de pseudomixoma peritoneal. O doente foi submetido a laparotomia exploradora com toilette abdominal que evidenciou a origem do pseudomixoma num cistoadenocarcinoma mucinoso do apêndice ileocecal.
A retração capsular hepática pode apresentar diversas causas intrínsecas ou extrínsecas, sendo o PMP uma causa extrínseca muito rara; de facto, a lobulação da margem hepática causada pela compressão extrínseca por implantes mucinosos adjacentes é específica do PMP2,3 e confere uma aparência pseudocirrótica que deve ser prontamente reconhecida. O caso descrito tem a particularidade de se tratar de um homem jovem, cujo diagnóstico foi estabelecido através de suspeição clínica aliada aos achados imagiológicos altamente sugestivos e à análise do líquido ascítico.
Figura I

Tomografia computadorizada abdominal (corte axial) a evidenciar ascite heterogénea com lobulação secundária das margens hepática (aparência pseudocirrótica) e esplénicas por implantes mucinosos do PMP.
BIBLIOGRAFIA
1. Simis DRC, Almeida ER, Anderson AJPG, Simis T, Dos Santos NB. Estucoqueratose: Relato de caso e revisão da literatura. An Bras Dermatol. 2000;75(SUPPL. 2):16.
2. Xia G, Tan V, Miranda R, Sutherland T. Causes of hepatic capsular retraction : a pictorial essay. Insights Imaging [Internet]. 2016;831–40. Available from: http://dx.doi.org/10.1007/s13244-016-0520-7
3. Marques S, Carmo J, Bispo M, Chagas C. Gelatinous Ascites : A Characteristic Finding of a Rare Entity Ascite Gelatinosa : Um Achado Característico de uma Entidade Rara. GE J Port Gastrenterologia [Internet]. 2016;23(1):54–5. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/j.jpge.2015.07.001