Doente do sexo feminino, 73 anos, com antecedentes de hipertensão, asma e rinite alérgica. Recorreu ao Serviço de Urgência por quadro de odinofagia e tosse com expectoração com cerca de 10 dias de evolução, com sensação subjectiva de febre de início na véspera. Adicionalmente referia que desde há 10 anos que apresentava períodos de sensação de peso retroesternal, com necessidade de indução de vómito para alívio sintomático e episódios esporádicos de regurgitação alimentar em moderada quantidade. Ao exame objectivo apresentava-se febril (temperatura timpânica de 38,5ºC) com sibilos dispersos à auscultação pulmonar. Analiticamente apresentava leucocitose 13 700/uL e elevação de PCR 6,22 mg/dL. Realizou radiografia torácicas com incidência póstero-anterior e em perfil que revelaram duas hipotransparências bosselada de limites bem definidos, a maior das quais proeminente a partir do mediastino à esquerda, com presença de nível hidro-aéreo e a menor de localização inferior à primeira.Complementou estudo imagiológico com TC-torácica que identificou um esófago distendido com abundantes resíduos alimentares, com aspectos sugestivos de acalásia e atelectasia da pirâmida basal direita condicionada pela importante distensão esofágica. Assumiu-se o diagnóstico de traqueobronquite aguda no contexto de prováveis microaspirações, iniciou antibioticoterapia empírica com amoxicilina e ácido clavulânico e foi internada para estudo adicional. Durante o internamento, realizou endoscopia digestiva alta que esclarece as alterações prévias como correspondendo a dois divertículos de grandes dimensões, um em localização epibrõnquica e outro de localização epifrénica, localizados no esófago médio e distal. Verificou-se melhoria rápida da infecção respiratória, tendo alta com indicação para vigilância e acompanhamento em consulta de Gastrenterologia para realização de estudo baritado, sem novos episódios de infecção respiratória.
Os divertículos esofágicos constituem uma patologia relativamente rara que ocorre em 1% da população, sobretudo em doentes de meia-idade ou idosos e uma das principais complicações são as infecções respiratórias recorrentes causadas por episódios de aspiração alimentar.1 A clínica cursa com disfagia e desconforto retroesternal e os achados no exame físico são frequentemente normais.2
O tratamento de divertículos esofágicos depende da existência de sintomas e encontra-se relacionado com a dismotilidade subjacente, podendo necessitar de tratamento com dilatação pneumática, toxina botulínica administrada no esfíncter esofágico inferior ou tratamento cirúrgico se em contexto de acalásia.3,4
A prevenção de aspirações depende da idade do doente, comorbilidades e tamanho do divertículo, não existindo dados que comprovem o benefício de uma estratégia específica. Podem ser tentadas medidas gerais, tais como o ensino do doente que deve mastigar adequadamente os alimentos e evitar a sua ingesta em decúbito. A abordagem pode ainda incluir avaliação por nutricionista para alteração de hábitos alimentares que favoreçam fenómenos de aspiração e utilização de inibidores de bomba de protões em doentes com refluxo gastro-esofágico concomitante. Contudo, se verificada a persistência de sintomas ou novos episódios de aspiração alimentar, deverá ser ponderado tratamento endoscópico ou cirúrgico, com miotomia e diverticulectomia.5,6
Figura I

Radiografia torácica (Incidência póstero-anterior e perfil) revelando com duas imagens bosseladas intra-torácicas, a maior das quais para-hilar esquerda com nível hidro-aéreo
Figura II

Tomografia computadorizada torácica identificando esófago distendido com abundantes resíduos alimentares, com aspectos sugestivos de acalásia
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