Mulher, 68 anos, com antecedentes conhecidos de hipertensão arterial, diabetes mellitus, dislipidemia, obesidade, hipotiroidismo, fibrose e hipertensão pulmonar, apneia do sono, linfoma (massa orbitária identificada 22 anos antes, medicada com corticoterapia de forma transitória, sem seguimento), é internada por lesão renal aguda oligoanúrica e anemia normocítica normocrómica. Por elevação da proteína C reactiva e leucocitose, iniciou antibioterapia empírica com Piperacilina + Tazobactam 3.375 g, de 6/6horas.
O estudo complementar confirmou a presença de espessamento septal de predomínio intralobular e subpleural, derrame e espessamento pleural bilateral, espessamento aórtico parietal difuso desde a crossa até à porção da aorta abdominal e rins tumefactos com algumas áreas hipodensas, sem sinais de hidronefrose. Após 10 dias de antibioterapia e terapêutica diurética, evoluiu desfavoravelmente com elevação sustentada de retenção azotada e anúria, a condicionar quadro de anasarca, insuficiência respiratória e síndrome urémico. Iniciou técnica de substituição da função renal, da qual se manteve dependente durante um mês. Realizou biópsia renal que revelou infiltrado linfocitário e histiócitos espumosos, positivos para CD68 e FXIIIa no exame imunohistoquímico, sugestivo de Histiocitose de Erdheim-Chester. Apesar das medidas instituídas, a doente desenvolveu múltiplas intercorrências (infecção do tracto urinário a Klebsiella pneumoniae ESBL, isquemia de grau IV do membro inferior esquerdo, com necessidade de amputação, febre com ponto de partida indeterminado, tendo cumprido antibioterapia empírica com vancomicina e gentamicina, com melhoria do quadro ao 15º dia). Acabou por falecer antes do estadiamento e início de terapêutica dirigida à histiocitose.
A doença de Erdheim-Chester é uma histiocitose de células não Langerhans, rara, com atingimento multiorgânico, que resulta da infiltração difusa de tecidos por histiócitos.1,2 A sua clínica é variável, dependendo da localização e grau de envolvimento, e as suas manifestações clínicas podem ocorrer ao longo de anos, dificultando o seu diagnóstico.3
A lesão renal é normalmente de causa obstrutiva, resultando do desenvolvimento de pseudofibrose retroperitoneal, no entanto, pode também resultar da infiltração do parênquima renal por histiócitos4 como se observou no caso descrito. O desenvolvimento de doença renal com necessidade de técnica dialítica é raro, mas pode ocorrer.1
Figura I

Tomografia computadorizada com contraste revelando infiltração perrirenal homogênea bilateral.
Figura II

Biópsia renal na coloração de Prata, com infiltrado linfocitário e histiócitos espumosos
BIBLIOGRAFIA
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3. Cavalli G, Guglielmi B, Berti A, Campochiaro C, Sabbadini MG, Dagna L. The multifaceted clinical presentations and manifestations of Erdheim-Chester disease: Comprehensive review of the literature and of 10 new cases. Annals of the Rheumatic Diseases. 2013 Oct;72(10):1691–5.
4. Sanchez JE, Mora C, MacIa M, Navarro JF. Erdheim-Chester disease as cause of end-stage renal failure: A case report and review of the literature.International Urology and Nephrology. 2010 Dec;42(4):1107–12.