Doente do sexo masculino, de 55 anos, com antecedentes de síndrome depressivo, tabagismo ativo (4 UMA), hábitos alcoólicos que cessou há cerca de 6 anos e sem qualquer medicação habitual. Recorreu ao serviço de urgência no final do verão por lesões cutâneas e parestesias nos membros superiores com 2 semanas de evolução. Referia prurido na palma das mãos. Negava queixas álgicas nos membros, cefaleias ou quaisquer eventos trombóticos prévios. Ao exame objetivo encontrava-se consciente e orientado, eupneico em ar ambiente, com membros superiores quentes, ruborizados e pulsos palpáveis. Apresentava lesões petequiais ao nível tenar direito (Figura 1) e punctiformes eritrocianóticas ao nível do membro superior esquerdo (Figura 2). Analiticamente apresentava hemoglobina de 24.1 g/dL, hematócrito 75.8%, sem outras alterações de relevo. Foi admitida Eritromelalgia secundária a eritrocitose, pelo que iniciou hidratação e realizou flebotomia terapêutica, tendo tido alta com AAS e referenciado para consulta de Imunohemoterapia e Hematologia. Nas consultas seguintes realizou novas flebotomias. No entanto, apesar de melhoria numa fase inicial, apresentou-se sintomático nas consultas subsequentes. Realizou medulograma que se revelou inconclusivo por coagulação da amostra. A eritropoietina sérica encontrava-se diminuída (1.85 mUI/mL), ferro 28 mcg/dL, ferritina 20 ng/ml, sat transferrina 6.7%. Neste sentido, e apesar do medulograma não confirmar o diagnóstico, assumiu-se Policitemia Vera e iniciou hidroxiureia.
A Eritromelalgia é uma patologia rara caracterizada por dor episódica, eritema e calor das extremidades, habitualmente nos membros inferiores.1 É geralmente aliviada pelo frio e agravada pelo calor, atividade física ou ortostatismo.2,3 Neste sentido, os sintomas são mais graves e mais frequentes no verão.3
Poderá ser primária ou secundária. A Eritromelalgia secundária é muitas vezes associada a uma variedade de patologias, nomeadamente síndromes mieloproliferativas, patologias vasculares, do tecido conjuntivo ou certos fármacos.2,3 As formas secundárias são habitualmente menos graves do que as primárias, podendo nestes casos a apresentação clínica ser unilateral e afetar apenas os membros superiores.3 A terapêutica assenta essencialmente no tratamento da patologia de base, sendo que o AAS poderá apresentar um papel importante nas doenças hematológicas.2
Figura I

Lesões eritrocianóticas na palma da mão direita
Figura II

Lesões eritrocianóticas no membro superior esquerdo
BIBLIOGRAFIA
1. Leroux MB. Erythromelalgia: A cutaneous manifestation of neuropathy? An Bras Dermatol. 2018;93(1):86-94. doi:10.1590/abd1806-4841.20187535
2. Mann N, King T, Murphy R. Review of primary and secondary erythromelalgia. Clin Exp Dermatol. 2019;44(5):477-482. doi:10.1111/ced.13891
3. Miranda S, Le Besnerais M, Langlois V, Benhamou Y, Lévesque H. L’érythromélalgie : approche diagnostique et thérapeutique actuelle. Rev Med Interne. 2017;38(3):176-180. doi:10.1016/j.revmed.2016.08.012