Doente do sexo feminino, 82 anos, sem diagnósticos prévios relevantes, admitida em enfermaria de Medicina Interna por quadro de astenia e perda ponderal de 17% em três meses. Negava outros sintomas constitucionais ou consumptivos. Na observação salientava-se icterícia e desidratação, abdómen doloroso à palpação, sem dor à descompressão, esplenomegália palpável e adenopatias axilares palpáveis bilateralmente.
Laboratorialmente destacava-se anemia normocítica e normocrómica (Hb de 9.5g/dL), hiperbilirrubinémia de 6.5mg/dL (máximo verificado de 19mg/dL), LDH 557U/L, beta2-microglobulina de 31mg/L (cut-off 3mg/L) e alfafetoproteína normal; autoimunidade, serologias virais e infecciosas, carga viral de EBV e CMV, negativas.
Pela suspeita de doença linfoproliferativa realizou-se mielograma, sem alterações, e biópsia de gânglio axilar, que ficou em curso.
Realizada tomografia computorizada toraco-abdómino-pélvica que destacava adenopatias axilares bilaterais, esplenomegália homogénea e hepatomegália.
Iniciada corticoterapia ao sétimo dia de internamento, após parecer da especialidade de Hematologia. Verificada evolução clínica e laboratorial desfavorável, nomeadamente com desenvolvimento de lesão renal aguda KDIGO 3 (creatinina máxima de 4,6mg/dL e ureia máxima de 213mg/dL), critérios de coagulação intravascular disseminada e de síndrome hemofagocítico. Ao exame objectivo, de novo, destacavam-se sinais de discrasia hemorrágica e excreção, a nível cutâneo, de depósitos cristalinos inframilimétricos, friáveis, de cor esbranquiçada, interpretados como nuvem urémica (Fig. 1 e 2).
Foi iniciado suporte transfusional e administração de imunoglobulina, sem resposta, com evolução para falência multiorgânica, verificando-se o óbito após quinze dias de internamento.
O resultado da biópsia ganglionar, posterior ao óbito, estabeleceu diagnóstico de Linfoma não Hodgkin de pequenas células B, com diferenciação plasmocitóide.
A nuvem urémica é um achado raro de disfunção renal grave, que sinaliza a necessidade de indução dialítica emergente. Deve-se à excreção de ureia pelas glândulas sudoríparas e o seu tratamento relaciona-se com o controlo da causa condicionante de urémia1. No caso apresentado, a ausência de diagnóstico em tempo útil contraindicou o incremento de medidas.
Figura I

Neve urémica ao nível do tórax.
Figura II

Neve urémica ao nível do membro superior direito.
BIBLIOGRAFIA
1. Raina S, Chauhan V, Sharma R, Sharma R. Uremic frost. Indian Dermatol Online J. 2014;5(Suppl 1):S58. doi:10.4103/2229-5178.144545